Antes de se tornar um famoso diretor de videoclipes (Depeche Mode, U2, Echo & The Bunnymen, Nirvana, Arcade Fire) e longas-metragens (Control, O Homem Mais Procurado), o neerlandês Anton Corbijn revelou-se ao mundo como um extraordinário fotografo. A partir da segunda metade dos anos 1970, contribuiu para muitas das mais famosas revistas europeias de música clicando magistrais momentos de artistas do rock e do cinema como Bruce Springsteen, Bob Dylan, Tom Waits, Siouxsie, Morrissey, David Bowie, Robert DeNiro, Björk, Eurythmics e, sobretudo, o Joy Division. A aliança do gosto pela arte pop com um olhar aguçado para capturar instantâneos de rara poesia e beleza tornou seu nome conhecido nas últimas décadas em todo o planeta. E muito provavelmente por isso ele tenha escolhido o fotojornalista nova-iorquino Dennis Stock como o centro das atenções de seu mais recente filme.
Lançado no segundo semestre do ano passado no circuito alternativo de salas e festivais europeus, Life – Um Retrato de James Dean (Life, EUA/Reino Unido/Alemanha/Canadá/Austrália/Holanda, 2015 – Paris Filmes) chega agora aos cinemas brasileiros para desvendar os bastidores dos mais icônicos retratos de James Dean, realizadas sob encomenda por um então iniciante fotógrafo de artistas e celebridades de Hollywood para a revista Life – um dos maiores semanários de variedades e cultura que já circulou pelas bancas e livrarias dos Estados Unidos (e que deixou de ser publicado após nove décadas de atividade, em 1972). O recorte escolhido por Corbijn vai do primeiro (uma festa na casa de um famoso produtor cinematográfico) ao último contato (semanas antes do acidente automobilístico que tirou a vida de Dean, no dia 30 de setembro de 1955). Aos poucos, o diretor vai desvendando a oblíqua relação entre os dois, que ao longo de algumas semanas se equilibrava entre diferenças de temperamento e uma certa admiração mútua que rapidamente um passou a nutrir pelo outro.
Aposta dos estúdios Warner Bros para tornar-se a mais nova e arrebatadora estrela dos filmes da companhia (em uma época onde as empresas cinematográficas detinham o poder na indústria do cinema e controlavam sob rédea curta a carreira e o comportamento de atores e diretores, ainda meros trabalhadores formais para seus patrões), James Dean mostrava-se muito incomodado com a transição rumo à fama em 1954. Seu talento fora, em um piscar de olhos, da intensidade do circuito teatral alternativo nova-iorquino para o consumo das grandes massas. Por isso era uma pessoa bastante arredia, mostrando um gênio rebelde e confrontante ao estabilishment, driblando com frequência compromissos profissionais de divulgação dos filmes e de sua imagem. Na pele de Dean, Dane DeHaan dá um show de atuação. Sua fala arrastada, a herança caipira da família conservadora em Indiana e a atitude extremamente blasé com tudo e todos (inclusive com o “amigo” Stock) dão o tom do início ao fim da história contada no filme, que acerta ao procurar mostrar o avesso da glória do momento “nasce uma estrela” do ator que viria a se consagrar como um dos ícones da cultura jovem do Século 20 logo após a sua trágica morte aos 24 anos de idade.
James acabara de estrear com o pé direito em Hollywood. Vidas Amargas, seu primeiro longa-metragem, chegara aos cinemas em março de 1955, preparando a plateia americana para aquele que viria a ser o seu grande filme, Rebelde Sem Causa, programado para estrear sete meses depois, no fim de outubro. É a imagem de um astro pronto para brilhar que logo captura a atenção de Stock. Ele quer ser o primeiro a revelar para o mundo toda a magia que observara nos olhares e no comportamento cotidiano de Dean. Por isso, não mede esforços para segui-lo em seus afazeres longe das câmeras. Voa de Los Angeles para Nova York para flagrá-lo em seu habitat natural, junto a amigos do meio artístico e intelectual em que desenvolveu seus primeiros passos profissionais. Logo depois, aproveita uma viagem dele à fazenda de Indiana para fotografar momentos de intimidade junto aos familiares. No meio disso tudo, ainda tenta contornar os constantes problemas vividos junto à ex-esposa, que não se cansa de cobrar pensão e uma maior presença junto ao filho pequeno. Ainda em uma cruzada ferrenha para livrar-se da imagem do vampirinho adolescente dos filmes da saga Crepúsculo, Robert Pattinson também dá um show na interpretação da turbulenta vida pessoal e profissional de Dennis.
Melhor ainda do que a afinada dupla de protagonistas está a mão certeira do diretor. Não bastasse assinar mais um trabalho com belíssima cinematografia, ainda reproduz com incrível exatidão todos os momentos (o antes, o durante e o logo depois) que cercaram a produção completamente improvisada das tais fotos realizadas por Stock para a Life. Para quem gosta tanto da cultura pop do Século 20 quanto da arte de eternizar um breve instante da vida em uma imagem, através do olhar e do auxílio da luz, Anton Corbijn encanta mais uma vez.
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